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quinta-feira, 10 de agosto de 2017

DEUS E OS MEUS LUGARES INÓSPITOS


Deus e meus lugares inóspitos


Davi, no Salmo 139, faz uma pergunta retórica: “para onde me irei do teu Espírito, ou para onde fugirei da tua presença?” (Salmo 139.7). O homem pode estar longe de Deus, mas o Senhor não se aparta de sua vida, mesmo que sua disciplina seja para a severa disciplina. Contudo, vemos como Adão, diante da nudez advinda do pecado não suportou ser encontrado por Deus e escondeu-se em uma das árvores do jardim (Gênesis 3.8-11).

Contudo é possível que a tristeza agarre de tal maneira os nossos olhos que fujamos não por medo, mas pela mais profunda desorientação como foi o caso dos discípulos de Emaús (Lucas 24.13-16). Em ambos os casos, a fuga foi resultado do pecado cometido ou que deixou o coração lento a crer na vontade de Deus (Lucas 24.25). O produto da soma coração corrupto e enganoso (Jeremias 17.9), mais a tentação constante (1Pedro 5.8) e morarmos em mundo caído (1João 5.19) é sem dúvida nenhuma a possibilidade de nos desviarmos do reto caminho do Senhor.

O Salmista fala de alguns lugares extremos em que os homens podem buscar como fuga e que os outros homens não poderão ajuda-los nesses lugares: os altos céus, os abismos, os confins dos mares e as trevas. Como vimos alguém pode requisitar essas regiões por pecaminosa obstinação como o profeta Jonas, mas não podemos nos esquecer de que as adversidades podem nos levar a esses sítios também e estarmos perdidos, desorientados e cegos pela dificuldade em lidar com os dias maus.

Gostaria de aproveitar uma citação o filme Rock Balboa, atualmente conta a história de Rock o famoso pugilista do passado que agora é viúvo, negligenciado pelo filho e dono de um restaurante italiano. Esse marasmo é quebrado quando é desafiado a uma “última” luta com um boxeador jovem, mas em declínio. A produção é nostálgica e mostra diversas recordações que são reminiscências dos outros filmes da série. Em uma das cenas, o filho revela como era difícil viver a sobra do nome do pai e mesmo assim conseguir avanços com esforço próprio e pede para que o pai desista do confronto já programado e ouve de seu pai: “o mundo não é um grande arco-íris, é um lugar sujo, é um lugar cruel, porque não quer saber o quanto você é durão, vai botar você de joelhos e voe vai ficar de joelhos para sempre se você deixar. Ninguém vai bater tão duro como a vida, mas não se trata de bater duro. Se trata de o quanto você aguenta apanhar e seguir em frente, o quanto você é capaz de agüentar e continuar tentando é assim que s consegue vencer” (sic).

Obviamente, esse texto do Rock foi extraído de um compendio teológico, contudo, seguindo o pensamento de R.C. Sproul, no qual afirma que todos são teólogos, a questão e sabermos se são bons ou maus, por isso, para avaliarmos esse excerto e qualquer outro advindo precisamos confrontá-lo com as Escrituras, nossa única regra de fé e prática e pra essa análise ficar mais rica vamos usar como modelo a vida de Jó.

De fato o mundo é feio e cruel, não porque Deus o tenha criado assim, pois quando terminou toda a obra da criação viu que tudo era muito bom (Gênesis 1.31), mas o pecado dos nossos primeiros pais trouxe essa realidade conturbada em que vivemos (veja Romanos 8.20). Contudo o pensamento de Rock tem um problema essencial: a questão do mal. Acredita que o mundo vai bater forte ao ponto de cairmos de joelho. Esse pensamento é perigoso, porque vê o mundo como uma realidade autônoma, uma energia que castiga as pessoas sem nenhum critério e de forma aleatória. Quando se tem essa concepção das adversidades jamais compreenderemos de fora adequada o propósito das adversidades que nos atingem e nunca a receberemos com a alegria daqueles que esperam perseverar (Tiago 1.2,3).

Os problemas não são frutos do acaso, mas fazem parte da obra do criador que por meio deles castiga o ímpio, assim como ora disciplina, ora prova o cristão. Com certeza, o Senhor baterá forte, porque tem sua “vontade é boa, perfeita e agradável” (Romanos 12.2). Em alguns momentos, quando caímos nas tentações provenientes de satanás, e precisamos que o bordão e o cajado do bom pastor batam com firmeza para que voltemos ao reto caminho. Devemos nos lembrar de que Deus só disciplina a filhos e se estamos vivendo em pecado em a devida disciplina isso mostra que não somos bastados (Hebreus 12.8) O ser humano, longe na graça, naturalmente, foge de Deus, contudo até mesmo o eleito, porque vive em mundo pecaminoso, porque é passível de tentações e é um pecador pode cair em tentação. Dessa maneira, na Bíblia, vemos Adão, que logo depois do pecado, fugiu da voz de Deus (Gênesis 3.8), o mesmo aconteceu com o Profeta Jonas para não pregar em Nínive (Jonas 1.3) e não há quem, distante dos meios de preservação, que não esteja suscetível a cair (1Coríntios 10.12) e buscar uma confortável rota de fuga.

Um jovem perdido nas drogas ou uma família devastada pela imoralidade, por mais perdidos e isolados em seus desencontros podem ter certeza de que por mais degradantes e complexas que sejam suas realidades, apesar delas o afastarem de Deus, elas jamais afastam ou impedem que Deus aja na vida dos seus eleitos. Calvino entende que o salmista, do versículo 7 ao versículo 12 do Salmo 139, “dá continuidade à mesma ideia de ser impossível que os homens, por meio de qualquer subterfúgio, ludibriem os olhos de Deus”.

Davi mostra que se pode buscar um esconderijo nos céus. O Salmista está falando da morada de Deus, o extremo oposto dos abismos (שְׁאוֹל-Sheol: o mundo dos mortos). Obviamente, Davi está falando de maneira metafórica. Existem aqueles que acreditam que podem se fazer de uma suposta e superficial piedade uma maneira de enganar a Deus. Os fariseus eram mestres nessa atividade (Mateus 23.26), pois cultivavam um zelo meramente externo para com a lei, que não fazia transformações internas neles. Jesus, para ilustrar essa realidade, conta uma parábola em que um fariseu e um publican subiram ao templo, aquele orava: “Ó Deus, graças te dou que não sou como os demais homens, roubadores, injustos, adúlteros, nem ainda com este publicano. Jejuo duas vezes na semana, e dou o dízimo de tudo quanto ganho (compare com Mateus 23.23)” (Lucas 18.11,12), contudo este, sem coragem de levantar a cabeça batia no peito dizendo: “Ó Deus, sê propício a mim, o pecador!” (Lucas 18.13).

Paulo, antes de sua conversão andou nesses caminhos, tortuosos (Filipenses 3.5), todavia foi encontrado por Jesus no caminho de Damasco e abandonou qualquer honraria humana, considerando-as como refugo e perda para ganhar a Cristo (Filipenses 3.7,8). A biografia do Apóstolo dos Gentios nos ensina que podemos tentar fugir de Deus por meio de uma rígida observância na Palavra, contudo, por ser externa e superficial, não e capaz de agradar o Senhor. Quando eleitos como Paulo se encontrarem nesse terrível caminho, o Senhor os derrubará e os humilhará para que se quebrantem e abandonem as pretensões de agradar a Deus por obras que, na melhor das hipóteses, são trapos de imundícia para o Senhor (Isaías 64.6).

Contudo Davi garante que Deus está até mesmo no mundo dos mortos, poderíamos ir além afirmando que o Senhor está em todos os lugares e nessa onipresença está em sua implacável justiça até mesmo no inferno a julgar os ímpios que viveram incautos nos ditames da vaidade da carne.

O Salmista usa a imagem das extremidades do mar para mostrar outro lugar que seria impossível a Deus. O mar, na Bíblia, é a imagem do caos e da instabilidade, por isso, não existirá na nova terra (Apocalipse 21.1). Contudo Jonas sabe muito bem que mesmo no coração dos mares sua oração foi ouvida pelo único capaz de sondar mente e coração (Jonas 2.3-7). O mesmo pode ser dito da escuridão, pois o lusco-fusco da luz em contraste com o dia também estará ausente na cidade escatológica (Apocalipse 21.25; 22.5).

Portanto, nem nas mais densas trevas, nem as extremidades dos mares, nem as alturas, tampouco os mais infinitos abismos podem impedir a obra soberana do Criador. Como diria a sobrevivente dos campos de concentração Corrie Tem Boom: “não há abismo tão profundo que o amor de Deus não seja mais profundo”.




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