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sexta-feira, 30 de outubro de 2015

CALVINO: DITADOR OU REFORMADOR?


Calvino: ditador ou Reformador?
Calvino é uma figura mal compreendida, porque, devido a grande influência católica romana de nosso país, é pintado como um ditador que misturou a sã pregação da Palavra a uma busca desenfreada por domínio político usando de sua posição para calar seus inimigos. Dom Estevão Tavares Bettencourt O.S.B. (1919-2008), proeminente teólogo da igreja de Roma do séc.XX, transmite essa ideia quando afirma: “em 1555, Calvino havia conquistado vitória sobre todos os seus inimigos. Nenhum pode mais lhe abalar a posição de ditador religioso, e também político, na sua ‘Roma protestante’, para onde afluíam os emigrados protestantes da França, da Itália e da Inglaterra” (Crenças, religiões, igrejas e seitas: quem são?, 1995, p. 31).
A fé romana equivoca-se ao afirmar que Lutero foi o precursor da Reforma Protestante do séc. XVI. De fato, o “o destino de Martinho Lutero e o da Reforma se tornaram inexoravelmente ligados, de modo que, agora, tentar imagina a Reforma sem Lutero é como pensar o cristianismo primitivo sem Paulo” (Timothy George, Lendo as Escrituras com os Reformadores, 2015, p.136), todavia não podemos esquecer que antes do Reformador alemão a igreja contou com homens como John Wycliffe (1320-1384), John Huss (1369-1415) e Savonarola (1452-1498). O historiador Alderi de Souza Matos (Fundamentos da Teologia Histórica, 2008, p.155) afirma que “se Zuínglio foi o fundador da tradição reformada, João Calvino, nascido na pequena Noyon, no nordeste da França, foi seu grande consolidador e defensor”.
Uma boa resposta a crítica mordaz de Dom Estevão a Calvino como o Papa da Roma Protestante estaria na descrição que Montegomery Boice (in Steve Lawson, A Arte Expositiva de João Calvino, 2012, p. 15), faz do Reformador de Genebra: “Calvino não tinha outra arma senão a Bíblia [...]. Ele pregava a Bíblia todos os dias, e, sob o poder desta pregação, a cidade começou a ser transformada. Conforme o povo de Genebra adquiria conhecimento da Palavra de Deus e era transformado por ela, a cidade tornou-se, como John Knox chamou-a mais tardem uma Nova Jerusalém, de onde o evangelho espalhou-se para o resto da Europa, para a Inglaterra, e para o Novo Mundo”.
Sobre esse poder avassalador da Palavra Lutero afirma: “Veja meu exemplo. Eu me opus às indulgências e a todos os papistas, mas nunca pela força. Simplesmente ensinei, preguei, escrevi a Palavra de Deus. De outro modo, não fiz nada. E, então, enquanto dormia ou bebia cerveja em Wittemberg, com meus amigos Phillip e Amsdorf, a Palavra enfraqueceu tanto o papado que nunca um príncipe ou imperador conseguiu lhe causar tanto dano. Eu não fiz nada. A Palavra fez tudo” (in Timothy George, Lendo a Bíblia com o Reformadores, 2015, p.16)
Seria um terrível equívoco, até mesmo aos romanistas, comparar Roma a Genebra e Calvino ao Papa, pois, nas entrelinhas, está se admitindo que a postura papal de infalibilidade só é tolerada pelo amontoado de argumentos humanos supersticiosos que entorpecem as mentes áridas pela água pura da Palavra de Deus.
Genebra era governada por quatro síndicos que eram eleitos pelo voto. Esses cidadãos controlavam não só os negócios temporais (como a condenação do herege Serveto), mas os religiosos (já que o Estado não era laico). Segundo o historiador Rev. Alderi de Souza Matos Calvino jamais exerceu cargos políticos em Genebra e muito menos foi o ‘ditador’ daquela cidade. Na realidade, durante a maior parte do seu ministério, ele teve um relacionamento difícil com as autoridades civis”.
De fato, se Calvino fosse um ditador, deveria ter implantado a celebração contínua da Ceia, porque assim compreendia Atos 2.42. Como déspota teria êxito, quando em 1537, decidiu restringir o acesso a Ceia (que era mensal) àqueles que não tinham uma vida condizente, assim como obrigar os moradores de Genebra a ouvir os sermões pregados (Alister McGrath, A vida de João Calvino, 2004, p.121). George afirma que os Conselhos municipais recebiam amigavelmente o movimento evangélico, pois queriam expandir suas liberdades frente a autoridades como imperadores, bispos ou reis, mas, diante de mudanças radicais, tendiam a limitar os avanços (Timothy George, Lendo as Escrituras com os Reformadores, 2015, p.173).
Na páscoa de 1538, Calvino e Farel foram expulsos de Genebra e, finalmente, aquele completou sua viagem a Estrasburgo, mas ficou sossegado apenas até 1941, pois o Cardeal Sadoleto começou a investir no retorno de Genebra para a fé Romana. Como o Conselho não possuía uma pessoa a altura de Calvino para enviar uma resposta chamou Calvino que reage da seguinte maneira em carta a Pedro Viret: “certamente, não foi sem um sorriso que li o trecho de sua carta em que se mostrou tão preocupado com minha saúde que me recomendou, com base nisso, Genebra! Por que não me recomendou logo a cruz? Pois seria muitíssimo preferível morrer de uma vez a ser, novamente, enviado a esse lugar de tormento”. O pastoreio em Genebra foi tão traumatizante que o vê como uma tortura, mas, pouco tempo depois, escreve a Willian Farel: “conquanto eu não seja ardiloso, não me faltariam pretextos pelos quais pudesse, astutamente, me esquivar de maneira a justificar-me diante dos homens, mostrando que não houve erro da minha parte. No entanto, tenho plena consciência de que é com Deus que tenho de tratar, à vista do qual não se sustentam tais artifícios da imaginação”.

Vemos, nesses trechos, dessas duas Cartas de Calvino, que ele está disposto a ir para um lugar de tortura, um lugar que seria preferível à morte e, que denegrirá sua saúde, não para obter os benefícios humanos (ele os tinha em Estrasburgo), mas única e exclusivamente para cumprir com a vontade de Deus. Segundo Lawson (A arte expositiva de João Calvino, 2012, p. 25), chegou, novamente, em Genebra no dia 13 de setembro de 1541 e ele que pregava em sequência (verso por verso, semana após semana), ao reassumir o púlpito, que fora obrigado a deixar há três anos, tomou a Bíblia e ao invés de fazer um sermão que exortasse as pessoas para a injustiça que acontecera com ele, apenas continuou a pregar do texto que havia parado na sua última pregação. Esse, de fato, não é um ditador, mas um Reformador.

Um comentário:

  1. https://www.youtube.com/watch?v=31qEV6xyzho&list=PLJVzwAfeM4P0WhJcdPDTuEehC2rx_YPHi
    é sempre bom ver a verdade sobre um assunto! marcos Lopez

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