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domingo, 12 de abril de 2015

A Bagagem invisível



A bagagem invisível
É comum ouvirmos que casais que se davam bem no namoro quando casaram começaram a brigar. Alguns vão dizer que esses são problemas típicos do casamento como se a bênção matrimonial desligasse o botão harmonia e desse início à guerras intermináveis. Talvez uma afirmação conhecida por muitos casais seja: “você não me entende!”. Contudo o que as famílias carecem para amadurecerem nesse sentido? Como viver um casamento para a glória de Cristo?
Exceto Adão e Eva, todos os casais trazem com o enxoval simples ou ricamente bordado uma bagagem invisível, que eles próprios não tem consciência de sua dimensão, mas que existe e é profundamente pertinente.Nela se encontram nossas influências. Todos nós temos um modelo de família ideal em nossas mentes e ao casarmos sabemos como queremos ou não queremos ser. Essa influência foi construída ao longo de nossa vida olhando o relacionamento das pessoas ao nosso redor, especialmente os nossos pais.
Essa mala contém as primeiras raízes de nossos acertos e, principalmente, de nossos erros. Ela nos ajuda quando nos permite desviar dos erros feitos por nossos pais (Ez 18.14) ou imitar seus acertos. Todavia é maléfica quando nos leva a exigir do outro a postura que encontrávamos em nossos progenitores.
Frequentemente, alguns casais vivem anos não um ao lado do outro, mas de seres imaginários que eles forjaram a partir daquelas influências que trouxeram de suas casas e passam a vida querendo enquadrar o cônjuge nos seus padrões. Isso denota uma terrível rebeldia, porque primeiro se quer tomar o lugar de Deus e mudar o coração do outro e em segundo lugar se quer impor um padrão humano que está, naturalmente, aquém das Escrituras.
Dessa maneira, a Palavra é sábia ao orientar os casais: “deixa o homem pai e mãe e se une à sua mulher, tornando-se os dois uma só carne” (Gn 2.24).
Segundo o Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento (DIT), o verbo asab (עזב) implica partir, abandonar e soltar (p.1101). No contexto de Gênesis 2.24, esse verbo transmite a ideia de que esse deixar o pai e a mãe pelo filho ou a filha (apesar da ênfase de ish [אִ֔ישׁ] estar sobre o homem) deve ser feita de maneira contínua. Derek Kidner (1967, p.62), citando Gerhard Von Rad, afirma: “a união matrimonial de ambos deve ser um laço exclusivo (um homem deixa), permanente (...e se une), e selado por Deus, pois o próprio Deus, como pai da noiva leva a mulher ao homem”. Kidner enfatiza que o ato de deixar deve, impreterivelmente, preceder o ato de unir. Moisés usa aqui o verbo dabaq (דבק) “usado com bastante frequência no Antigo Testamento para designar coisas físicas que se grudam umas às outras, em especial as partes do corpo” (DIT, p. 291). Dessa maneira, maneira o homem e a mulher, pelo casamento são ajuntados com tal intensidade que são mesma pessoa.
Todavia essa orientação não exime o indivíduo de honrar seu pai e sua mãe e cuidar deles na velhice. Jesus condena de maneira contundente a prática do corbã (Mc 7.11), segundo Hendriksen (1998, p.205), quando um judeu dedicava uma grande quantia ao templo e, por isso, ficava dispensado, segundo os Mestres da Lei, de honrar seus pais. Calvino (1998, p.175), comentando a Carta aos Efésios (5.31), afirma: “aquele que quer ser um bom esposo não cessará de demonstrar que é filho de seu pai; mas preferirá o matrimônio como o mais santo de todos os laços”.
O objetivo do matrimônio é fazer do homem ser uma só carne com sua mulher de tal maneira que poderíamos repetir como Adão: “esta, afinal, é osso dos meus ossos e carne da minha carne” (Gn 2.24). Entretanto para que esse fim obtenha êxito existem alguns cuidados que os cônjuges devem observar:
1º. Reconhecer que não estão juntos apenas pelas afinidades, mas pela soberania de Deus (Lc 12.6,7). Salomão chega a afirmar: “A casa e os bens vêm como herança dos pais; mas do SENHOR, a esposa prudente” (Pv 19.14);
2º. O amor que une um casal não é um sentimento, mas uma decisão diária de receber o outro como ele realmente é. Dessa maneira, como afirma Dave Harvey, em Quando Pecadores dizem sim, casamentos felizes são construídos sobre o alicerce da misericórdia que tem como parâmetro o ato salvífico empreendido pelo próprio Deus (Lc 6.27-36). Calma, ser misericordioso não é fazer vista grossa, mas não batalhar pelos meus desejos e interesses, mas pela glória de Cristo. Harvey afirma: “a misericórdia não muda a necessidade de falarmos a verdade. Ela transforma a nossa motivação, que deixa de ser o desejo de vencer batalhas e passa a ser o desejo de representar a Cristo”.
3º. Se as pequenas manias cotidianas necessitam de misericórdia os pecados precisam de perdão (Mt 18.20,22), que deve levar em consideração que fomos perdoados de uma dívida impagável (Mt 18.23-35);
4º. As discussões devem seguir os parâmetros de Efésios 4.29 e chegar a uma solução que glorifique a Deus. Lembre-se: quando em uma discussão familiar houve um vencedor que não é o Senhor Jesus o marido e a esposa foram derrotados;
5º. O casamento melhora com atitudes orientadas pelas Escrituras e não com promessas e discursos bem elaborados; 
6º. A nossa mudança visa à comunhão mais íntima com o Senhor e não o interesse do cônjuge, tampouco podemos condicionar a correção de nossa conduta a decisão do outro em se corrigir também. Lembre-se de que a alma que pecar essa morrerá (Ez 18.4). Apesar de sermos um o progresso na santidade é individual;
7º. John Bettler disse: “seu côjuge sempre expõe seu ídolo”, ou seja, o marido, pela convivência conhece e expõe a ela seu ídolo, assim como a esposa a seu marido. Dessa maneira, Deus uniu um ao outro para que ambos cresçam na mortificação de seus pecados e na santidade, por isso, Lutero chamava o casamento de “a escola do caráter”. 
Essas dicas, que de nenhuma maneira são exaustivas, podem indicar o caminho da construção de um casamento ou de sua restauração, o que corre na contramão de nossos dias em que o divórcio tem sido facilitado como algo simples e corriqueiro, todavia, apesar de estarmos no mundo não pertencemos a ele (Jo 17.14), tampouco nosso casamento.

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