Reduzir ou não reduzir?
Eis a questão!: o sistema carcerário (parte 1 de 3)
Muito se falou na mídia sobre a redução da
maioridade penal, a PEC 171/1993, que visa alterar o artigo 228 da Constituição
Federal que diz: “São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos,
sujeitos às normas da legislação especial” para “São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às
normas da legislação especial, ressalvados os maiores de dezesseis anos,
observando-se o cumprimento da pena em estabelecimento separado dos maiores de
dezoito anos e dos menores inimputáveis, em casos de crimes hediondos,
homicídio doloso e lesão corporal seguida de morte”.
Essa proposta de emenda constitucional (PEC) tem
defensores e acusadores inflamados, que tomam para si o dever de salvar a
pátria. Não entrando tanto na variedade desses argumentos, o fato dessa
proposta vir sob uma aparente chancela de uma bancada que se denomina
“evangélica” passa a falsa ideia de que todos os cristãos ou pelo menos os
protestantes são favoráveis a essa alteração da Carta Magna de nossa nação.
Mas, à luz das Escrituras, é lícito ou não reduzir a maioridade penal de
dezoito para dezesseis anos?
Para começo de conversa, a Bíblia tem uma cosmovisão
diferente de ambos os lados que se digladiam sobre o reduzir ou não reduzir a
maioridade penal e podemos observar essas diferenças em três tópicos: a
redenção do homem, o conceito de adolescência e pena (conceito de sistema
carcerário). Veremos que em todas elas há uma ingenuidade humanística da
condição do homem.
Muito se ouve dizer sobre o sistema penitenciário
brasileiro como a paraliteratura Estação Carandiru,
todavia desde do princípio não se tinha essa ideia, pois o então príncipe
regente Dom Pedro de Alcântara, no dia 23 de maio de 1821, expede o decreto que
garante a liberdade individual de forma que ninguém possa ser preso sem ordem
por escrito de um juiz, assim como ficam abole “o uso de correntes, algemas, grilhões e
outros quaisquer ferros inventados para martirizar homens”[1]. Esse mesmo pensamento aparece na primeira
Constituição do Brasil (1824): “As Cadeias serão seguras, limpas, o bem arejadas, havendo
diversas casas para separação dos réus, conforme suas circunstâncias, e
natureza dos seus crimes”[2].
Esse pensamento vem ao encontro da obra Dos
Delitos e das Penas de Cesare Beccaria, onde afirma: “à medida que as penas
forem mais brandas, quando as prisões já não forem a horrível mansão do
desespero e da fome, quando a piedade e a humanidade penetrarem nas masmorras,
quando enfim os executores impiedosos dos rigores da justiça abrirem os
corações à compaixão, as leis poderão contentar-se com indícios mais fracos
para ordenar a prisão” (Cap.VI, p.15).
O Marquês de Beccaria entendia que a prisão para
interrogatório era necessária, mas não pode ser arbitrária, tampouco deixar
qualquer mácula àquele que poderia ser inocente. A lei de Execução penal (7.210
de 1984) entende que a pena tem dois objetivos: “efetivar as disposições de
sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica
integração social do condenado e do internado”[3]. Dessa maneira, o sistema penitenciário
brasileiro não visa apenas cumprir uma sentença, mas garantir a reintegração do
indivíduo à sociedade. Entretanto qualquer investimento para que se leve a
efeito essa disposição legal não tem boa aceitação do povo e até calorosos
manifestos, porque, enquanto o sistema quer ressocializar, a população deseja
apenas punir.
Segundo Costa Neto[4], existem basicamente três
sistemas prisionais: o pensilvânico ou da Filadélfia, no qual o detento ficava
isolado e incentivado a ler a Bíblia; o auburniano (por causa da prisão de
Auburn), e que o silêncio era uma imposição e o sistema progressivo (adotado no
Brasil), no qual o preso começa em regime fechado, depois passa para o
semi-aberto até o aberto (2.848 de 1940, art. 33 § 1º), porque se intenta reconduzir
gradativamente o encarcerado à sociedade que foi sentenciado a deixar.
Entretanto o ócio, a reincidência, a violência
sexual e a superlotação mostram a fragilidade desse sistema, que não consegue
cumprir o objetivo que se propôs, pelo simples propósito de não atentar para a
vontade de Deus claramente revelada nas Escrituras.
Segundo Portela[5], vemos no Antigo
Testamento três aspectos da lei: moral (vontade d Deus para o homem), civil (legislação
dada à sociedade de Israel) e cerimonial (legislação levítica). Apesar de
Cristo ter abolido a lei cerimonial (Ef 2.15), tampouco as leis civis, ambas,
segundo Kevan[6],
devem ser levadas em consideração, porque:
·
O termo torah transmite uma ideia mais ampla do
que um código autoritário de dever, mas algo que deve ser feito, mas também
algo que deve ser conhecido;
·
Não há contradição
alguma em obedecer por amor;
·
As obras da
lei são necessárias, mesmo que são seja para justificar o homem;
·
Orienta a
vida pessoal do crente;
·
Aponta para
Cristo.
A Bíblia não trata
sobre o sistema penitenciário, mas das cidades de refúgio (Nm 35). Segundo
Wenhan[7] esse método não pode ser
aplicado, porque não é mais a família (Nm 39.12, 19, 21, 24, 25, 27) que busca
o culpado, assim como não há mais a figura de um sumo-sacerdote. Contudo a
Bíblia prega um sistema de retribuição a faltas que podem ser restituídas, a
morte àquelas atentam contra a vida e a cidade de refúgio para quem cometeu um
crime culposo (Êx 21.13).
Se aplicássemos esse
método em nossa sociedade, quando alguém roubasse, não iria para a prisão, mas
restituiria o valor total do roubo, mais o seu quinto (Nm 5.7; Lc 19.8). Aquele
que assassinou morreria e a terra de refúgio existiria para preservar a
integridade de uma pessoa. Dessa maneira, o crime não compensaria. Em nosso
modelo, aquele que comete um crime é sustentado pelo contribuinte e os lesados
pelos delitos não ganham nada, além do prejuízo e com o gosto amargo de uma
suposta noção de justiça.
A ideia de que um
sistema carcerário, mesmo que em condições peculiares, pode reintegrar um homem
a sociedade á acreditar em um falso arrependimento, que segundo Watson[8], pauta-se no medo, a luta
externa contra as antigas faltas e o abandono daquelas que são convenientes
abandonar. Somente a ação sobrenatural da graça pode regenerar o homem e mudar
seu caminho. Dessa maneira Watson afirma: “o
verddeiro abandono acontece quando os atos pecaminosos cessam pela infusão de
um princípio da graça, como um ambiente deixa de estar seguro pela infusão da
luz”[9].
Se o arrependimento é
uma “graça especial do Espírito Santo”[10],
a educação não possui esse poder miraculoso, por isso, deveria se garantir que
as atitudes tivessem o fim que merecem sem criarmos depósitos humanos, que além
de caro, são inúteis.
Portanto, a redução da
maioridade penal não é uma luta cristã, porque a finalidade dessa lei não se
coaduna com o interesse da Palavra.
[1] http://www2.camara.leg.br/a-camara/conheca/historia/reinounido.html.
Acessado no dia 10 de julho de 2015 às 12h05.
[2] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao24.htm.
Acessado no di 10 de julho de 2015 às 12h11.
[3] http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/leis/L7210.htm.
Acessado no dia 10 de julho de 2015 às 12h30.
[4] http://jus.com.br/artigos/24073/sistema-penitenciario-brasileiro-a-falibilidade-da-prisao-no-tocante-ao-seu-papel-ressocializador.
Acessado no dia 11 de julho de 2015 às 01h04.
[5] http://www.solanoportela.net/palestras/tres_aspectos.htm.
Acessado no dia 15 de agosto de 2015 às 23h44.
[6]
KEVAN, E. A Lei Moral. São Paulo:
Puritanos, 2000, p.9.
[7]
WENHAN, G. Números: introdução e
comentário. São Paulo: Vida Nova, 1981, p.57.
[8]
WATSON, T. Doutrina do Arrependimento.
São Paulo: PES, 2012, p.17-20.
[9] Ibidem,
p. 16,17.
[10]
Ibidem, p.18.
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